sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

Divã

Ela entrou na sala, sentou-se confortavelmente e, como se estivesse só, começou a falar:

Tenho me sentido estranha, sinto uma sobriedade mórbida com momentos de profunda reflexão, momentos estes que se intercalam entre o sentimento de esperança e da falta dela, somados a uma tristeza tão sutil, mas de presença forte e constante que já não dói, mas faz-se sentida, pois pesa o coração e cada dia ele vai ficando mais e mais cansado.

Não tenho sentido vontade de falar, conversar, nem tenho paciência para ficar escutando. A sensação é de que o silêncio me conforta e com isto tenho orado mais, tenho lido mais, tenho lido até a bíblia. Minhas conversas atuais são mais monólogos com "Deus", monólogos, pois não tenho escutado "Ele" falar. Acredito que tem sido assim porque não tenho perguntado nada mesmo, tenho é desabafado e pedido força, sabedoria e fé, e "Ele" me olha e acena com a cabeça.

Sinto como se eu estivesse mudando por dentro. As coisas que estou sentindo me mostram o quanto tudo aqui tem estado vazio e fugaz, e vou percebendo que tenho dois mundos paralelos, o só meu e o que vivo com o restante do mundo, um mundo de pessoas que parecem não perceber o quanto tudo isto é nada. Às vezes a paciência foge de mim de tal forma que desejo que de repente a morte apareça e me abrace, mas também às vezes o simples cantar de um bem-te-vi me faz querer viver pra sempre ou virar passarinho.

Não tenho conversado com as pessoas sobre como tenho me sentido,  e elas também não estão interessadas em saber como as outras se sentem. Hoje em dia elas querem das outras, sorrisos, favores e piadas, cada um tem os seus problemas, então os dos outros não nos interessa, por isto venho aqui, te pago, você me ouve, não diz nada, e eu sigo com o coração um pouco mais aliviado para suportar estes dias estranhos.

Eu a chamei pelo nome, olhei para ela e disse que tinha acabado a sessão.



De Camila Mascarenhas

Um comentário:

  1. Nossa, passei por isso ano passado, mas a minha analista(e Ele com certeza)conseguiu me fazer enxergar aonde estava errando e hj estou aqui... minha amiga... O silêncio traz para a gente tantas respostas, mas extravasar/vomitar tudo o que nos incomoda faz um bem tão grande, nem que seja na frente do espelho. Eu ensaio as falas que gostaria de ter, mesmo sabendo que elas nunca vão sair de dentro da minha boca, de dentro da minha mente, de dentro do meu coração...
    Parabéns amiga !

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